Partia de Flores novamente pelas montanhas da Guatemala. A viagem tinha destino Laquín. Uma pequena aldeia às portas de umas cascatas de cor verde turquesa envoltas de uma floresta tropical.
A aldeia tem 10 igrejas, católicas e evangélicas, um mercado central que abre dois dias por semana, alguns restaurantes pequenos e algumas mercearias. A população é muito jovem e grande parte da população vive nas montanhas. São mais de 3000 habitantes numa montanha que apenas se vislumbra vegetação. Depois de um dia de viagem, vagueava pelas ruas para saciar a barriga. Dobrava a esquina e não pensava duas vezes, seria uns grelhados com a família de Patrícia que iria saciar-me nessa noite. A jovem amamentava o bebé de poucos meses enquanto a sua mãe preparava o meu jantar. Patrícia era uma jovem de pequenos sonhos, poucos estudos e muita responsabilidade familiar. Era uma jovem mãe com pouco mais de 20 anos e que ajudava a sua mãe nas tarefas da mercearia. Contudo, tinha tempo para estudar dois dias por semana para ser professora na universidade desta pequena aldeia.
No pequeno hostel de Laquin, El Muro, Pelon vivia de uma forma tranquila depois de regressar dos Estados Unidos. À volta do balcão deste hostel quase vazio, juntaríamos uma quinteto um quanto lunático. Madelijne, holandesa a viajar sozinha pela Guatemala fascinava-se com a amabilidade desta comunidade pobre. Julius, um francês a viajar por vários anos pela América central, de ar meio desajeitado e lunático fazia-nos dar gargalhadas das suas aventuras em Semuc Champey. Ana, um transexual pouco aceite na sociedade, a viajar cantando e tocando guitarra animava a noite com músicas românticas. E Pelon, o dono do hostel que nos brindava com rum e cerveja enquanto se lamentava da falta de amor.
Na manhã seguinte, Virgilio, Luke e mais alguns amigos indicavam-me o caminho pelas montanhas para chegar a Semuc Champey. Numa carrinha de caixa aberta com mais de 20 pessoas seguíamos num caminho de terra com cerca de 10 km para chegar às cascatas de Semuc Champey. À porta, várias crianças a tentar a sua sorte vendendo chocolates por uns tostões. Entravamos pela selva tropical rodeados de árvores e animais até ao mirador das fotografias. Dali, observávamos as cascatas verdes, uma imagem magnífica tal e qual os retratos da internet. Água verde, translúcida e uma floresta envolvente adelgaçando o rio. Dali, as pessoas na água pareciam formigas. E também ali, algumas crianças brincavam no mirador enquanto a sua mãe vendia mangas e melancias fatiadas. Os seus sorrisos eram doces e abriam-se sem receio para a minha câmera.
Depois de alguns momentos com os companheiros de viagem, descíamos para mergulhar nas águas verdes. No meio da natureza perdidos por horas e horas… em mergulhos constantes. Semuc Champey é um complexo de cascatas com cerca de 300 metros de pedra lima arquitectadas em socalcos, onde abaixo o rio Cahabón corre com fortes correntes. Este local não é só para turistas mas também para guatemaltecos. Este é um dos locais eleitos pelos guatemaltecos para passar um domingo em piquenique com toda a família. Ali estavam, famílias numerosas, com crianças aos gritos e brincadeiras a chapinhar na água. Mães de fatos de banho e t-shirts a mergulhar acalmavam ânimos. Pais ensinando os primeiros mergulhos aos seus filhos.
Um dia passado no meio da selva. E naquele caminho de regresso via o quanto a pobreza vivia nas redondezas. Velhos a carregarem lenha à cabeça. Mulheres de bebés de colo à cintura e sacos de vegetais e frutas à cabeça. Crianças pedintes penduradas nos carrinhas de transporte. Homens de catanas, galochas e chapéus, com a pele envelhecida, com o rosto pouco contente. A vida não seria fácil por ali…
Erik era uma criança de 8 anos, órfão, vivia com a sua avó nos recônditos da montanha. Apesar da sua inteligência evidente gostaria de ir poucas vezes à escola e ainda menos de voltar pela noite a casa. Vivia com a sua avó e passava o dia por Laquín com as gorjetas que os turistas deixavam cair e com os favores dos comerciantes locais. Comia no restaurante local quando Luke lhe pagava a comida. Dormia no hostel do Pelon quando já não conseguia voltar a casa. Era um menino da rua.
Nas montanhas da Guatemala, onde a pobreza se escondia entre os montes e vales, estaria um dos mais belos tesouros da Guatemala, Semuc Champey.
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